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Relatório da Abin admite que alertou sobre falta de oxigênio e colapso em Manaus na pandemia
Documento confirma subnotificação de mortes por Covid-19 e mostra que avisos foram ignorados pelo governo Bolsonaro

Documentos divulgados em 2025 pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) confirmam que houve subnotificação de mortes por Covid-19 em Manaus e que o colapso no sistema de saúde da capital do Amazonas, incluindo a falta de oxigênio, foi previsto com meses de antecedência pelos agentes do órgão. As informações fazem parte de um relatório interno que reúne as “memórias” da atuação da Abin durante a pandemia.
De acordo com o conteúdo, os alertas partiram de agentes lotados na Superintendência da Abin no Amazonas e foram enviados a Brasília antes da explosão de casos em 2020 e da crise de oxigênio registrada em janeiro de 2021. Mesmo assim, as advertências foram ignoradas pelo governo federal, então sob comando do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Um dos trechos do relatório cita que, já em abril de 2020, a Abin produziu um documento interno sobre a cadeia de suprimento de gases medicinais e advertiu para o risco de colapso. “Fizemos um relatório, em abril de 2020, falando sobre gases medicinais. Nesse documento já alertávamos que, no caso de uma demanda exponencial, poderia faltar nas pontas das cadeias logísticas. Foi exatamente o que aconteceu em Manaus alguns meses depois. É triste porque era uma coisa que poderia ter sido evitada. Foi uma tragédia anunciada”, relatou um agente da Abin que trabalhou no estado durante o período mais crítico da crise.
Os informes da agência também destacam que a realidade em Manaus era bem pior do que a divulgada oficialmente. “A realidade que relatávamos nos documentos não se alinhava com um discurso que na época defendia que as notícias que saíam na mídia sobre Manaus eram exageradas. Só que não eram. Pelo contrário, o que a imprensa mostrou foi pouco perto do que aconteceu de verdade”, afirmou o servidor.
Segundo ele, a subnotificação de mortes por Covid-19 era evidente. “Segundo esses dados oficiais, só se contabilizava a morte por Covid-19 de pacientes que tinham passado por algum teste, com resultado positivo. Mas o número de doentes que eram testados lá era muito restrito. Não tinha teste para todo mundo. Só uma porcentagem dos mortos era de fato testada, e só essa parte entrava na estatística. E a gente sabia que era muito mais, porque a gente via o que estava acontecendo na cidade, as filas no cemitério, as filas no hospital, gente morrendo, caindo na calçada na frente do hospital.”
Para levantar dados mais precisos, a Abin chegou a deslocar agentes a funerárias da capital amazonense. “Chegamos a um número médio de 28 mortes por dia em Manaus nos três anos anteriores à pandemia. Durante a pandemia, chegaram a morrer 167 pessoas por dia no pico da crise. Essas 28 foram subindo, subindo, 50, 100, 150, até chegar a bater 167 no pico da crise em 2020”, revelou o servidor, que teve sua identidade preservada.
O relatório ainda revela o desconforto na Direção-Geral da agência em Brasília com os informes produzidos em Manaus. “Era perceptível, até porque não era segredo para ninguém que a Direção-Geral tinha um certo alinhamento ideológico com o governo de então”, disse o agente. Ele relatou pressão para suavizar os relatórios diante das críticas do então prefeito de Manaus, que fazia oposição ao governo federal.
Outro trecho relata o impacto emocional da crise nos próprios agentes da Abin. “Pessoalmente, foi muito difícil ter que lidar com todas essas questões: preocupação com o trabalho, com a equipe, com a própria saúde. Foi um período de muito estresse, ansiedade, insônia”, contou o servidor.
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