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Suspeita de corrupção: Paulo Dantas compra fuzis 100% mais caros que o Governo Federal

Licitação milionária para aquisição de 1.540 armas da Glock levanta denúncias de direcionamento, preços acima do mercado e uso de verba federal sem transparência

Governador Paulo Dantas - Fotos: Bruno Santos/O Alagoano

A compra de 1.540 fuzis da marca Glock pelo Governo de Alagoas, sob a gestão do governador Paulo Dantas (MDB), acendeu um alerta de suspeita de corrupção e superfaturamento. O contrato, avaliado em cerca de R$ 27 milhões, prevê o pagamento de R$ 17,6 mil por unidade, valor 100% superior ao praticado pelo Governo Federal em aquisições recentes de armamentos semelhantes. A diferença de preços e as condições do edital chamaram a atenção de especialistas e empresas concorrentes, que apontam possível direcionamento do processo licitatório. A reporatgem foi publicada primeiro pelo The Gun Trade, site especialista em armamento.

O pregão, realizado pela Agência de Modernização da Gestão de Processos (Amgesp), exigia especificações técnicas idênticas às do novo fuzil Glock GR-115, um modelo ainda pouco difundido no mercado e sem histórico operacional comprovado no Brasil. A inclusão de características únicas, como a desmontagem sem uso de ferramentas, teria restringido a participação de outras fabricantes, criando um cenário favorável para a Glock vencer a disputa. As empresas Taurus, Springfield e Sig Sauer apresentaram questionamentos formais, mas tiveram seus pedidos de impugnação negados.

A Taurus, que chegou a oferecer o mesmo tipo de armamento por R$ 15 mil, foi desclassificada após solicitar prorrogação de prazo para envio de documentos. Já a Sig Sauer levou o caso ao Tribunal de Contas do Estado (TCE/AL), alegando irregularidades e “reincidência de editais direcionados” à fabricante austríaca. Segundo especialistas, o processo apresenta uma série de pontos técnicos fora dos padrões nacionais, incluindo testes exigidos que não seguem as normas da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) — órgão que regula licitações quando há uso de verba federal.

Outro ponto polêmico envolve os testes de qualificação do armamento, que serão realizados na Áustria, país de origem da Glock. Embora o edital mencione que a viagem da comissão técnica de Alagoas seria “sem ônus ao Estado”, o secretário de Segurança Pública, Flávio Saraiva, e outros quatro servidores solicitaram diárias que somam R$ 111 mil, pagas pelo governo alagoano. A viagem, custeada pela empresa vencedora, gera questionamentos sobre a moralidade e transparência do processo, já que a presença de representantes públicos em testes financiados pela própria fabricante pode configurar conflito de interesses.

Além das falhas técnicas, há suspeitas de que recursos federais tenham sido utilizados na licitação, o que exigiria o cumprimento das normas da Senasp. O edital, porém, não seguiu tais parâmetros, abrindo espaço para ilegalidade e possível responsabilização dos gestores envolvidos. Caso o uso de verba federal seja confirmado, o processo pode ser suspenso e os responsáveis, investigados por improbidade administrativa e fraude em licitação.

A situação já motivou ações no Tribunal de Contas de Alagoas e na Justiça, apresentadas por fabricantes concorrentes, que pedem a suspensão do contrato. O governo e a Secretaria de Segurança Pública foram procurados, e após a publicação desta matéria nos enviaram uma nota que segue abaixo na íntegra.

Nota da Secretaria de Segurança

Nota de Esclarecimento

A Secretaria de Estado da Segurança Pública de Alagoas esclarece que o processo licitatório em curso para a aquisição de novos armamentos e equipamentos segue sendo conduzido com total transparência, rigor técnico e respeito às normas legais.

O Governo de Alagoas tem como prioridade dotar as forças de segurança com equipamentos de qualidade, seguros e com o melhor custo-benefício, garantindo eficiência no uso dos recursos públicos.

É importante destacar que as Polícias Militar e Civil apenas manifestaram intenção de adesão à ata da Senasp, mas não efetivaram qualquer aquisição. A Secretaria, por sua vez, optou por realizar seu próprio processo licitatório, considerando os critérios técnicos específicos de avaliação dos equipamentos e insumos.

No caso citado pelo site, a empresa mencionada, cujo fuzil calibre 5.56 aparece na ata da Senasp com preço aproximado de R$ 5 mil, ofertou o mesmo equipamento no processo conduzido por Alagoas por valor superior a R$ 15 mil.

No certame estadual, a empresa inicialmente vencedora foi desclassificada por não apresentar a documentação exigida, conforme determina a legislação. Assim, a segunda colocada, uma fabricante austríaca, foi convocada para apresentar as amostras e submetê-las aos testes técnicos e operacionais, realizados com total rigor e imparcialidade.

Esses testes — previstos em edital — são fundamentais para assegurar que os armamentos atendam aos padrões de desempenho, segurança e confiabilidade exigidos para o uso policial. Caso algum equipamento não cumpra os critérios estabelecidos, o processo é reavaliado e pode ser estendido a outras empresas, conforme a legislação prevê.

Alagoas é referência nacional em procedimentos licitatórios voltados à modernização das forças de segurança, atuando sempre com base nos princípios da legalidade, economicidade e transparência.

A Secretaria reafirma, por fim, seu compromisso com a verdade, a lisura dos processos e a excelência na gestão pública
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